20.9.04

Once In a Lifetime

Fui apresentada tardiamente à banda Talking Heads quando ela já tinha se dissolvido e isso já faz quinze anos. Foi um caso de paixão à primeira audição. Para a época, a fusão de ritmos negros e latinos era algo muito novo, em contraponto à dureza do rock punk e new wave, que dominavam a cena 80s. A carreira solo do vocalista David Byrne só acentuou o lado experimental, a busca por novos ritmos, e produziu discos como o excelente Rei Momo, recheado de mambos, sambas e outras latinidades. Era ouvir e sair dançando. Ele também foi responsável pelo lançamento, no exterior, do então esquecido pela mídia Tom Zé. Apesar de toda essa empatia, o Brasil nem sempre é ponto obrigatório de suas turnês. Por isso a importância do show em que ele apresenta seu novo CD, Grown Backwards, sem deixar de tocar algo do repertório dos Talking Heads, como 'Road To Nowhere' e 'Once In a Lifetime'.
 
O ex-líder do Talking Heads apresentou na última quinta-feira um show impecável, misturando velhos hits da banda a um excelente repertório de canções do disco Grown Backwards. Ao contrário da última turnê que o músico fez no Brasil (The Visible Man), cheia de efeitos visuais e trocas de roupa - algumas bem esdrúxulas e teatrais - este show marcou pelo figurino sóbrio (uma elegante farda marrom) e atuação minimalista de Mr. Byrne. Não menos inovador no entanto, mostrou seu talento ao transitar por antigas canções, velhos compositores e novos ritmos, combinando em um mesmo show a canção francesa 'Au Fond du Temple Saint', de Georges Bizet, o rock nervoso de 'Psycho Killer' e a ária 'Un di Felice, Etérea', da La Traviata, de Giuseppe Verdi.

As novas composições, mais complexas, melódicas e com arranjos para sexteto de cordas (a ótima The Tosca Strings, quatro violinos e dois violoncelos), percussão, baixo, bateria e guitarra, até que foram bem assimiladas pelo público da casa. Mas o Tom Brasil ferveu mesmo aos primeiros acordes do clássico 'Road to Nowhere', do disco Little Creatures. A platéia, em sua imensa maioria na casa dos 40 anos, cantou e chegou a ensaiar umas dancinhas quase empolgadas em meio às mesas que lotavam a pista; porém a maior parte do tempo ficaram sentados, apenas apreciando as reboladinhas afetadas do escocês.

Por sinal, a nota destoante da noite foi o comportamento lamentável do público. Entre uma música e outra e até mesmo durante, o burburinho de vozes na platéia era incessante: conversinhas paralelas, cantadas baratas, discursos embriagados, gritos mal-educados, nada disso parecia ter fim. Um incidente isolado é uma coisa que acontece. Mas o que vem sendo cada vez mais comum nas casas de show de São Paulo é uma total falta de respeito de parte do público para com o artista e as pessoas que estão ali para apreciar um espetáculo por completo e não apenas para ver o 'cara daquela banda que tocava aquelamúsica' enquanto aproveita pra 'xavecar umas minas'.

Palmas: para o som da casa
Vaias: para o consumo excessivo de uísque

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