CONDE CHIQUINHO SCARPA
Cavalheiro da mais fina estirpe inventada, no fundo não é mais que um conde papalino - honraria decorativa e, segundo alguns, não-transmissível, conferida pela Igreja Católica ao seu pai, em retribuição a donativos; porém ostenta seu título e herança com mais garbo e galhardia que qualquer membro legítimo da família Real luso-brasileira. Em uma deliciosa combinação de luxo e riqueza com sincera cafonice, exibe sua vida no Facebook como todos nós, ora mostrando 'seu melhor', em caricatos trajes brancos e chapéu panamá durante viagem pelo Mediterrâneo, ora revelando puerilmente intimidades como seu quarto de dormir. Nunca nós, os mais de 100 mil seguidores do seu perfil, estivemos tão próximos da nobreza antes.
Em Scarpa, até a afetação é genuína. Cuecas com monogramas, suspensórios, roupas sob medida, lenços no bolso e abotoaduras, seus trajes e maneiras são tão típicos do que nós, plebeus, entendemos por um conde, que parecem uma caricatura. Chiquinho, não sendo conde, imita um conde à perfeição - tanta, que parece nem ser verdade (e realmente não é). O que pode ser mais autêntico do que isso?
Francisco não precisaria trabalhar; seu pai, também Francisco, falecido recentemente aos 103 anos, era rico suficiente para poupar seus descendentes dos dissabores da vida proletária por várias gerações. Mas trabalha, administrando empresas da família e como instrutor de aikidô - mais uma de suas excentricidades. No entanto, último dos Scarpas, sua verdadeira função social é ser playboy - ou como ele prefere, bon vivant; Chiquinho mereceria ser tombado como patrimônio cultural intangível de uma high society em extinção. Seus romances memoráveis, suas aventuras em Saint Tropez, entrevistas bombásticas, casamentos e divórcios midiáticos, misteriosos problemas de saúde e financeiros, quedas espetaculares e voltas por cima em rodopios morais sem derramar um pingo da taça de espumante nos transformam em espectadores privilegiados de uma adorável e legítima comédia de costumes.
Sua vocação para o humor e a polêmica não é de hoje: em 1991 foi alvo de discursos indignados na Câmara dos Deputados por ter declarado, em entrevista para a Interview, ser dono de uma "criação de anões", que alugaria para trabalhar como garçons. Obviamente era mentira, mas o Conde precisou se explicar. Assim como precisou pedir desculpas ao Rainier III de Mônaco por ter insinuado um caso de amor com a princesa Caroline - outra de suas piadas incompreendidas.
Da vida nada se leva
Esta manhã o Conde colocou mais uma cereja em cima do bolo de sua incomum biografia. Depois de uma semana em que virou novamente assunto na mídia, nas redes e das conversas de bar ao anunciar uma excentricidade sem precedentes - enterrar no jardim um carro de sua coleção, avaliado em R$ 1,5 milhão, a exemplo dos faraós - Chiquinho revelou de maneira teatral, para dezenas de veículos de imprensa, entre jornais, revistas e emissoras de TV: era tudo uma farsa por uma boa causa: atrair a atenção para uma campanha de doação de órgãos.
“Eu fui julgado por querer enterrar uma Bentley, mas a verdade é que a grande maioria das pessoas enterra coisas muito mais valiosas que meu carro. Elas enterram corações, rins, fígados, pulmões, olhos. Isso sim que é um absurdo. Com tanta gente esperando por um transplante, você ser enterrado com seus órgãos saudáveis que poderiam salvar a vida de várias pessoas, é o mais desperdício do mundo. O meu Bentley não vale nada perto disso. Nenhuma riqueza, por maior que seja, é mais valiosa que um único órgão, porque nada é mais valioso do que uma vida", anunciou Scarpa.
Sim; nada é mais valioso do que uma vida. E uma vida bem vivida, melhor ainda. Só gente muito mal-humorada e de visão limitada pra não apreciar todas as reviravoltas da saga do Conde Scarpa em nome de uma visão reducionista da luta de classes.
E se a vida do Conde, como a de todos nós, não se mede em valores materiais e sim em boas histórias pra contar, embora já tendo recebido duas extrema-unções, Scarpa segue ainda construindo, de anedota em anedota, seu verdadeiro legado para o mundo - mesmo não realizando seu maior sonho: "Quero ter filhos. Se eu não tiver filhos, a família Scarpa morre comigo. Mas quer saber? Se terminar comigo está bem terminado."
E quem há de discordar?
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Leia mais: perfil do Conde, por Mario Mendes (no fim da reportagem); e mais detalhes das travessuras do enfant terrible Chiquinho, por Cristina Ramalho para a Vogue RG
(*) Galeria de esquizoídolos |
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