30.12.05

AI, FOFINHOS

        todos tão bonzinhos
acariciam pés de alface entoando velhos mantras
e alimentando passarinhos;
varrem e içam as portas da casa pra brisa fresca entrar, ai
        ! tão evoluidinhos
mente e dentes brancos no varal bem afiados
sem pó nem ferrugem
sem fumaça, sangue ou tabaco;
        usam chinelos pra entrar em casa
e alpargatas pra ir até a horta;
        todos mandam muitos beijinhos
e alisam os gatos
comendo bons grãos, de soja e de trigo
        tem sentimentos bons pra caralho
e amigos muito queridos;
        todos são tão bonitos!
tão secos, limpos e asseados
que te deixam sujo, sozinho e ensopado
        do lado de fora do mundo encantado
e a rota alma órfã escangalhada
, cuspida do avesso como as tripas do consomèe vespertino
e enquanto assistem o rasgar da carne dura na descida da ladeira
você fica ali na noite
cão sem rumo
a ouvir navios
mastigando as flores que ali estavam
! tão ajeitadas
recém colhidinhas
numa manhã natalina ensolarada
mortas afogadas em vaso cristalino
margaridas lobotomizadas
        em cima da branca toalha de linho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário